Manuel Galrinho Bento (1948-2007)

A minha primeira memória do Bento remonta a 31 de Março de 1974. Jogava-se um Sporting-Benfica para o campeonato e o José Henrique, lesionado, saíra ao intervalo com o resultado em 3-2 para o Benfica.

Tinha 7 anos e estava nas Portas do Sol, em Santarém, com os meus pais, no habitual passeio dos tristes. Se fosse expressão comum nessa altura, podia muito bem ter pensado "estamos feitos". Deve ter sido outra, mas o sentido era o mesmo.

Até ao fim do jogo, o transistor, enquanto anunciava grandes defesas do Bento, berrou mais dois golos do Benfica e um do Sporting (e só de penalti aos 89 min.). Resultado final: um inesquecível 3-5.

Desde os 4 anos (até aos 35, mais ou menos) que fui um espectador assíduo dos jogos na Luz. Vi grandes jogadores (até o Eusébio). Mas, sem dúvida, aquele que mais me marcou foi o Manuel Galrinho Bento.

Foi por sua responsabilidade que eu obrigava o meu pai, durante tardes inteiras de sábado, a rematar bolas para balizas imaginárias que tentava guardar nos relvados anexos à Torre de Belém.

Foi a tentar seguir o seu destemido exemplo que, na final do campeonato inter-turmas do Maria Amália, parti um dedo de uma mão logo no início do jogo mas continuei em campo. O resultado foi 0-0 a.p. e só perdemos nos penalties. Ao contrário do que é habitual, era eu o primeiro a dizer que queria ir para a baliza...

Inesquecíveis a suas correrias loucas para desfazer cruzamentos nos limites da grande área. Inolvidável a coragem do Homem-borracha a por a cabeça onde os outros punham os pés. Para sempre ficam os voos impossíveis a sacar golos feitos.

A imagem está estafada, mas aplica-se que nem uma luva (de guarda-redes) ao Manuel: o Bento foi um Homem com agá grande. Directo e sempre de peito aberto. Foi por isso, também, que foi o principal prejudicado de Saltillo.

Até mesmo nos frangos! Três ao longo da sua carreira. Deve ter pensado: se tenho que dar frangos, vamos lá despachar isto! E deu as suas únicas três casas no Benfica - Liverpool 1-4.

Bento, como personagem cinematográfica, rivalizaria com Rocky Balboa. Com uma vantagem, ele existiu (existe) mesmo!

Comparado com certos "meninos vem da Fuoz" foi Deus. E um exemplo de coragem, integridade e carácter...

...e o melhor guarda-redes português de todos os tempos.

Estou certo que será ele o seleccionado para guardar as portas do céu.